Ser livre significa que eu devo ver a
mim mesmo como seguro e estar satisfeito comigo mesmo, como eu sou. Somente
assim eu serei livre. Se eu estou seguro e satisfeito comigo mesmo, todas as
outras buscas tornam-se secundárias porque eu não necessito de segurança ou
mudanças de situação para estar seguro e em paz comigo mesmo na situação na
qual me encontro.
Se, com todas as seguranças e prazeres, eu estou insatisfeito comigo mesmo, como eu poderei ver-me satisfeito? Nesse ponto é onde o ensinamento chamado de Vedanta vem e diz a você que o problema não está na carência de alguma coisa, mas em não saber que você não precisa de nada. O ensinamento transforma todas as buscas de uma pessoa em uma busca de conhecimento, ou moksa.
Se, com todas as seguranças e prazeres, eu estou insatisfeito comigo mesmo, como eu poderei ver-me satisfeito? Nesse ponto é onde o ensinamento chamado de Vedanta vem e diz a você que o problema não está na carência de alguma coisa, mas em não saber que você não precisa de nada. O ensinamento transforma todas as buscas de uma pessoa em uma busca de conhecimento, ou moksa.
Na visão de Vedanta, não há razão para você estar insatisfeito com você mesmo, porque você é totalmente aceitável para você mesmo - não por atitude, mas por fato. Isto não é uma crença; é um fato, um fato que pode ser descoberto. Somente alguma coisa que possa ser descoberta é um fato e o fato a ser descoberto aqui é que você não necessita de nada. Você é totalmente livre. O único problema é que você pensa que falta algo e a solução é que você veja que nada falta. Portanto, o problema é você e a solução é também você. Esta é a visão de Vedanta.
Não é o mundo que não satisfaz você, você é insatisfeito com você mesmo
O que é fundamentalmente buscado por
todos os seres humanos é chamado de purusartha em Sânscrito. Embora
aparentemente cada pessoa busque coisas diferentes na vida, existem quatro
objetivos universais que todo mundo busca - artha, kama, dharma e moksa.
Segurança e Prazer
Qualquer coisa que dê a você qualquer
tipo de segurança - emocional, econômica ou social - é chamado de artha em
Sânscrito. Segurança pode estar na forma de dinheiro, relacionamentos, um lar,
reconhecimento, influência, ou poder de qualquer tipo. Tais realizações apoiam
o ego e, portanto, fornecem alguma segurança para o ego. Embora pessoas
procurem várias formas de segurança em tempos diferentes, a busca de segurança
é comum a todos.
Buscar prazer é uma outra busca,
chamada de kama em Sânscrito. Qualquer coisa que satisfaça seus sentidos,
agrade sua mente, toque seu coração e evoque em você uma certa apreciação é
kama. Qualquer forma de prazer que você obtenha do seu lar ou relacionamento,
por exemplo, é kama. Música e viagens também são kama e não artha, porque
buscando-as você está buscando prazer e não segurança. Você não vai ao Havaí ou
às Bahamas para buscar segurança. De fato, você perde alguma segurança, em
forma de dinheiro, quando você vai a esses lugares.
O prazer tem muitas formas. Por
exemplo, prazeres sensoriais pode ser qualquer coisa, de sorvete em diante.
Prazeres intelectuais incluem jogar jogos, resolver quebra-cabeças ou enigmas,
e pesquisar campos de estudo. Existe outra forma de prazer vinda de observar as
estrelas, por exemplo, ou apreciar uma alvorada, uma flor, uma linda pintura ou
uma criança brincando. Porque esse prazer não é nem sensorial nem intelectual,
eu vou chamá-lo de prazer estético. Mesmo esses prazeres, que vão além dos
sentidos e do intelecto, também são kama.
Dharma, Como um Objetivo Humano
Há uma terceira busca, dharma, que não
é nem artha, segurança, nem kama, prazer. Em Sânscrito, dharma é uma palavra
com muitos significados. Aqui, ela se refere a um sentido de harmonia, à
satisfação vinda de ações altruístas como compartilhar ou ajudar outras
pessoas. A busca do dharma é diferente da de artha e kama, porque você
normalmente não ajuda outros para obter segurança ou prazer. Quando você
encontra alguém precisando de ajuda e você pode aliviar seu desconforto, você
se sente feliz. A alegria que você experimenta não é igual ao prazer que você
experimenta indo ao Havaí ou a um concerto.
Um médico, que não trabalha apenas por
ganhos financeiros, experimenta este tipo de prazer. Fazer trabalho de caridade
tem um resultado similar. Aqueles que estão aptos a descobrir alegria neste
tipo de serviço fazem isso, eu diria, por causa de uma certa maturidade e
entendimento da parte deles.
A satisfação que advém do processo
de amadurecimento de alguém é um tipo diferente de alegria. Não machucar alguém
ou fazer a coisa certa no momento certo, por exemplo, dá a você alegria - se
não agora, depois. Suponha que você tenha adiado fazer alguma coisa como lavar
roupas, passar o aspirador ou escrever uma carta. No dia em que você decide
fazer isso - e faz isso - você descobre que há uma alegria em finalmente fazer
o que devia ser feito, uma alegria que não é prazer nem segurança. É apenas
fazer o que é para ser feito, isto é dharma.
Dharma é a medida de sua maturidade,
quanto mais maduro você é, mais dharmico você é. Para ser maduro, um
entendimento do dharma e estar conforme com ele torna-se da maior importância
na vida de alguém, como veremos através da Bhagavadgita. Então, sem ferir o
dharma, fazendo o que é para ser feito você busca segurança e prazer.
Moksa: Liberdade
A quarta busca, moksa, é liberdade ou
liberação. Moksa é reconhecida como uma busca por poucas pessoas em qualquer
geração. Porque uma certa apreciação, maturidade ou "insight" sobre a
vida e suas lutas é necessária para entender moksa, as pessoas não a buscam
claramente, embora todo mundo esteja procurando liberdade, de fato.
Embora nós geralmente pensemos em
liberdade num sentido muito positivo, a palavra moksa é definida num sentido
negativo. Se há algo limitando você, do qual você quer tornar-se livre, esta
liberdade é chamada moksa. Por exemplo, um homem na prisão perdeu sua liberdade
de movimento e quer liberdade da prisão. Se alguém está usando muletas por
causa de uma fratura na perna, esse alguém deseja libertar-se das muletas. Da mesma
forma, uma criança que precisa de ajuda de uma parede ou da mão da mãe quer
livrar-se da ajuda externa e esforça-se para ficar de pé por si só. Da mesma
forma, moksa significa liberdade de algo que eu não quero. Que eu esteja ligado
a formas particulares de segurança revela um certo fato sobre mim mesmo - que
eu sou inseguro e que desejo ser livre de qualquer senso de insegurança. Indo
atrás de certas seguranças, eu não estou buscando as seguranças por elas
mesmas. Eu estou procurando libertar-me de ser inseguro. Da mesma forma, quando
procuro prazeres isso revela que eu estou agitado e não satisfeito comigo
mesmo. Eu tenho que fazer alguma coisa para achar prazer, o que significa que
eu quero ser livre do sentimento de insatisfação comigo mesmo.
Se eu estou sempre procurando segurança
e prazer, quando eu serei capaz de dizer "Eu consegui!"? Somente
quando eu me vejo como uma pessoa segura e satisfeita. Quando eu não mais sinto
a necessidade de procurar prazer e segurança, então eu posso dizer que sou livre.
Quando nós analisamos nossas várias
buscas - segurança, prazer e até mesmo dharma - nós descobrimos que não
buscamos realmente nenhuma delas. Por fim, todos estão buscando apenas moksa,
porque liberação de qualquer tipo de sentimento de falta é o que procuramos em
nossas buscas.
Moksa não quer dizer salvação. De fato,
não há nenhuma palavra em Sânscrito para salvação, o que é correto já que
salvação implica em certa condenação. Implica que alguém tenha que salvar você,
o que não é o que significa moksa. A palavra moksa refere-se apenas a
libertar-me da noção "Eu sou inseguro" e "Eu estou insatisfeito
comigo mesmo".
Ser livre significa que eu devo ver a
mim mesmo como seguro e estar satisfeito comigo mesmo, como eu sou. Somente
assim eu serei livre. Se eu estou seguro e satisfeito comigo mesmo, todas as
outras buscas tornam-se secundárias porque eu não necessito de segurança ou
mudanças de situação para estar seguro e em paz comigo mesmo na situação na
qual me encontro.
Discernindo o Problema
Se você necessita buscar segurança para
estar seguro ou buscar prazer para estar bem consigo mesmo, suas buscas serão
infinitas. Você vai gastar toda sua vida manipulando o mundo para satisfazer
você mesmo. No processo, você vai descobrir que duas mãos e duas pernas, cinco
sentidos e uma mente não são suficientes para lidar com todos os fatores
envolvidos. Sua mãe tem que ser satisfeita e sua sogra nunca pode ser
satisfeita! Há muitos eventos e situações, bem como forças da natureza, sobre
as quais você parece não ter controle.
Com seus poderes limitados e seu
conhecimento limitado, você descobre que você nunca conseguirá dimensionar as
exigências para obter as seguranças e os prazeres que você busca. É por isso
que a vida parece um problema. Apenas quando você atinge trinta e nove ou
quarenta anos e entra na crise da meia-idade é que você começa a entender isto.
Mesmo que você pense que seu casamento ou emprego é sua crise, você é a crise,
de fato. Sua crise não tem nada a ver com seu casamento ou qualquer outra
situação da sua vida.
Procurar segurança e prazer é muito
natural. Para uma pessoa que não analisou suas buscas, segurança e prazer
sempre parecem estar fora de si mesmo. "Eu sou inseguro", por
exemplo, é uma conclusão totalmente aceita, uma conclusão que nunca é questionada
ou posta em dúvida.
Como criança, minha segurança dependia
da constante proteção, amor e cuidado dos meus pais. Agora que sou crescido, a
segurança dos meus pais depende de mim, e a minha segurança está em algum outro
lugar. Portanto, como criança eu era inseguro e agora eu também sou inseguro.
Há uma troca constante no que eu tomo por segurança. Isto é comum a todo mundo.
Ninguém, entretanto, merece ter esse problema. Segurança e prazer não são o
problema. Que eu careça de algo não é o problema. O problema é que eu careço.
As coisas das quais eu careço sempre
mudam: eu careço de uma formação, eu careço de dinheiro, eu careço de filhos,
eu careço de netos. Qualquer coisa de que alguém careça é sempre peculiar à
própria pessoa num determinado tempo e espaço, e a carência de algo difere de
pessoa para pessoa e de cultura para cultura. Entretanto, o sentimento de
"Eu careço" é comum a todo mundo.
Existem muitas coisas das quais eu
careço. Eu posso carecer de um corpo saudável, um corpo mais alto, um corpo mais
magro, um nariz arrebitado, cílios mais longos ou uma cor de pele diferente. E
isto pode ser o começo de uma lista sem fim. Quanto mais você tenta obter o que
carece, mais você descobre que carece. Isto é como ir a uma loja para comprar
algumas coisas que você precisa e voltar para casa com mais alguns desejos a
serem preenchidos na próxima semana. É por isso que nós dizemos que o desejo é
como o fogo. Não importa o quanto você o alimenta, o fogo nunca diz,
"Basta!". Da mesma forma, eu nunca consigo dizer "Basta!" as seguranças e aos prazeres porque sempre haverá algo mais do qual careço.
Mesmo se um prazer particular é
preenchido, isso não será algo duradouro. Considere, por exemplo, a música.
Você compra um disco de uma música de sucesso*. Por que essa música é um
sucesso? Porque, como um homem violento, ela tira outras músicas da parada. A
música de sucesso do mês passado foi ultrapassada e não é mais um sucesso. Ela
agora apenas acumula poeira na sua estante. O que fez você feliz antes não mais
proporciona a mesma alegria. Você se cansa de tudo. Mesmo se Deus estivesse
perto de você todo o tempo, você iria eventualmente cansar-se Dele. Esta
mudança constante é natural, porque você está basicamente insatisfeito consigo
mesmo.
Se você fechar as portas, deixar o
mundo para trás e sentar-se numa cadeira confortável, você descobrirá se está
ou não satisfeito consigo mesmo. Você descobrirá que você não necessita de um
mundo de objetos, um mundo de livros ou o que quer que seja para estar
insatisfeito. Tudo que você necessita é você mesmo. Depois de alguns minutos
sentado com você mesmo, você vai querer levantar e ligar o rádio ou fazer
alguma coisa.
Para estar insatisfeito, portanto, não
é necessário nada além de você mesmo. Não é o mundo que não satisfaz você, você
é insatisfeito com você mesmo. E porque qualquer segurança ou prazer são
limitados por natureza - em termos de tempo, espaço e conteúdo - aquele que
está insatisfeito assim permanece a despeito de momentos de prazer ocasionais.
Quando então você irá preencher
completamente seus desejos por segurança e prazer? Eu não estou dizendo que
você não deva buscar segurança, este não é o ponto aqui. Nós estamos apenas
tentando entender a natureza de nossas buscas. Dinheiro, por exemplo,
definitivamente tem seu valor. Mas, se você pensar que há segurança no dinheiro
ou em qualquer outra coisa, o processo de busca torna-se infinito.
O eu inseguro, aquele que quer estar
seguro, na realidade não se torna seguro pela obtenção de algo que eu considero
ser seguro. Por exemplo, enquanto eu necessito de muletas, o sentimento de
insegurança permanecerá comigo. Sentir-me seguro porque eu tenho muletas não
significa que eu me tornei seguro. Eu tenho um falso sentimento de segurança
por causa das muletas, mas o sentimento de insegurança centrado em mim
permanece.
Suponha que eu seja inseguro e que o
que eu penso que é seguro seja tão inseguro quanto eu. Quando uma pessoa
insegura se casa com outra pessoa insegura para tornar-se segura o resultado
não é segurança. Tudo que resulta é um casamento entre duas pessoas inseguras.
Insegurança somada à insegurança não resulta em segurança, apenas resulta em
insegurança dupla. Portanto, um eu inseguro somado a qualquer coisa nesse mundo
não vai tornar-me seguro.
A Visão de Vedanta
Nós agora já percebemos que o problema
é: "Eu sou insatisfeito comigo mesmo", esse é um fato que não será
alterado apenas porque eu consigo momentos de segurança ou prazer. Que eu seja
inseguro ou infeliz não muda meramente porque eu adquiro certas seguranças. A
única solução é que eu me veja como uma pessoa já segura e aceitável.
Se, com todas essas seguranças e
prazeres, eu estou insatisfeito comigo mesmo, como eu poderei ver-me
satisfeito? Nesse ponto é onde o ensinamento chamado de Vedanta vem e diz a
você que o problema não está na carência de alguma coisa, mas em não saber que
você não precisa de nada. O ensinamento transforma todas as buscas de uma
pessoa em uma busca de conhecimento, ou moksa.
Na visão de Vedanta, não há razão para
você estar insatisfeito com você mesmo, porque você é totalmente aceitável para
você mesmo - não por atitude, mas por fato. Isto não é uma crença; é um fato,
um fato que pode ser descoberto. Somente alguma coisa que possa ser descoberta
é um fato e o fato a ser descoberto aqui é que você não necessita de nada. Você
é totalmente livre. O único problema é que você pensa que falta algo e a
solução é que você veja que nada falta. Portanto, o problema é você e a solução
é também você. Esta é a visão de Vedanta.
Dayananda Saraswati
Fonte: www.vidyamandir.org.br
Continuação...
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