Liberação é a compreensão total e final no coração de que não há um fazedor
O que é a escravidão? A escravidão é -
"eu" sou uma pessoa separada, com livre arbítrio e responsável por
minhas ações, e portanto, "eu" devo fazer boas coisas. O que é a
escravidão? O ego é a escravidão. "Quem" fica feliz ou
"quem" fica infeliz? O ego, o sentido de que se pode fazer. O corpo
não pode ficar feliz ou triste. Portanto aquele que fica feliz ou infeliz é o
ego. E o que é a liberação? Liberação é a liberdade do senso alternado de
alegria e tristeza. Liberação é a compreensão total e final no coração de que
não há um fazedor, nem um experimentador.
Toda religião te pede para se livrar do
ego, mas "aquele" para quem as religiões falam para se livrar do ego
- é o ego. É falado para o ego se livrar do ego! Mas o ego não vai cometer
suicídio. Portanto a questão realmente é: Quem criou o ego? Que temos que nos
livrar do ego - de acordo. Mas quem criou o ego? Você não criou o ego. De onde
poderia o ego ter vindo? De onde ele poderia ter vindo exceto da Fonte! Se você
chama essa Fonte de Consciência ou Energia Primordial, ou Deus ou Ciência
(awareness) não faz diferença, com tanto que você entenda que é a Fonte.
Portanto o ego também veio da Fonte. É
por isso que eu chamo o ego de Hipnose divina. A hipnose é - "eu"
considero a mim mesmo um ser separado com um sentido de que posso fazer. Por
que a Fonte criou o sentido de separação? Porque sem a separação as relações
inter-humanas não aconteceriam. É apenas por causa dessa separação que nós
temos amizade e inimizade, amor e ódio. Tudo isso acontece apenas porque cada
indivíduo considera a si mesmo um ser separado. E sem as relações inter-humanas
a vida como conhecemos não aconteceria.
Lembre-se, a Fonte tendo criado o ego,
ou a Hipnose divina, está no processo de remover a hipnose em alguns poucos
casos, não em todos os casos. Então o Ego - o sentido de separação, a hipnose
divina, o sentido de fazedor individual - basicamente foi destruído no caso de
poucos organismos corpo-mente chamados sábios.
O que permanece no caso do organismo
corpo-mente chamado sábio? A programação permanece. É por isso que você pode
ter dez sábios, e em cada caso o sentido de fazer pessoal foi demolido, mas
eles têm vidas diferentes. Por quê? Porque a programação é diferente. Em outras
palavras, embora o ego tenha sido destruído, a Fonte continua a usar aqueles
organismos corpo-mente dos sábios da mesma maneira que a Fonte usa os outros
organismos corpo-mente - introduzindo um estimulo e trazendo uma resposta.
Portanto os organismos corpo-mente dos sábios continuam a funcionar exatamente
como antes, mas sem o sentido de autoria das ações e sem o sentido de
separação.
Se o organismo corpo-mente do sábio tem
a programação de ter o pavio curto, então aquele sábio antes da liberação
costumava ficar bravo muito rápido. E depois da iluminação o sábio continua a
ficar bravo muito rápido. A programação é para a braveza surgir. A única
diferença é que antes o sábio costumava dizer, "eu não deveria ficar bravo
com meus amigos. Meus amigos não gostam disso. E me disseram para não ficar
bravo, pois assim minha pressão arterial irá subir, portanto tenho que
controlar minha braveza". Tudo isso era o envolvimento do ego, que
costumava aparecer antes do ego ser destruído. O que acontece depois do ego ser
destruído? Quando a braveza surge o sábio não diz, "eu estou bravo, eu não
deveria ficar bravo." Ele não diz isso. A braveza que surgiu e o efeito
dela é meramente testemunhado, incluindo as consequências. Por outro lado, se
algo está acontecendo e a compaixão surge, anteriormente o ego diria, "eu
sou um homem compassivo e as pessoas deveriam me respeitar". Mas depois
que o ego é destruído, não há tal pensamento. O sábio não pensa assim. Tudo o
que ele vê é a compaixão surgindo e tomando o seu curso.
A compaixão do sábio pode tomar
qualquer forma. Ao encontrar alguém machucado ele pode fazer um curativo nessa
pessoa, ou ao ver alguém passando necessidades ele pode dar-lhe algum dinheiro.
Então a compaixão surge e toma seu próprio curso, mas o sábio nunca está
envolvido naquela ação como sendo uma ação sua. Essa é a única diferença de
acordo com o meu conceito. O sentido de autoria das ações foi apagado para
sempre. Ele apenas testemunha as coisas acontecendo não como as
"minhas" ações ou as ações de alguma pessoa. Se a ação de algum outro
organismo corpo-mente machuca o sábio, o machucado estará lá. Mas sabendo que
ninguém faz coisa alguma, A Consciência é tudo o que existe, o sábio não pode
odiar ninguém. Quem ele irá odiar? Todas as ações são ações de Deus ou se você
quiser colocar de uma maneira diferente, todas as ações são o funcionamento
impessoal da Consciência. Então "quem" o sábio irá odiar? A
Consciência? Deus?
Com o ego tendo sido destruído o sábio
não fica orgulhoso; o sábio não se sente culpado, não odeia nem inveja ninguém.
Portanto a ausência de culpa, orgulho, raiva, inveja, torna a vida pacífica. E
é para esse fim que a busca toda tem sido - a paz no estado desperto que existe
no estado de sono profundo. Meu conceito de toda a busca espiritual é ter
aquela paz que prevalece durante o sono profundo, mesmo durante o estado
desperto, durante nossa vida diária de trabalho. E esse tipo de paz prevalece
em nossa vida diária se isto acontece: não há ego para sentir culpa, orgulho,
raiva ou inveja.
Cada evento, cada pensamento, cada
sentimento que diz respeito a qualquer "indivíduo" é um movimento na
consciência, trazido pela Consciência (Brahman).
Cada coisa ou objeto no universo
manifesto é um produto da Consciência, tanto durante a ilusão quando a
manifestação parecia ser "real", como depois da realização da
verdade. Não somos nada além da Consciência, e nunca fomos nenhuma outra coisa.
Talvez seria mais fácil de "entender" a Verdade, se fosse concebido
que nunca houve nenhum "nós" em momento algum, e tudo o que existe -
e tudo o que sempre existiu - é a consciência (Brahman).
"Nós" pensamos sobre nós
mesmos, consciente ou inconscientemente, como seres sencientes e, portanto,
como separados da manifestação: nós somos o sujeito e o resto da manifestação é
o objeto. A realidade é que "nós" como fenômeno manifestado, somos na
verdade nada além de uma parte do universo manifestado. O que nos faz pensar de
nós mesmos como separados é o fato que o aparente universo torna-se conhecido a
nós, como seres sencientes, através da senciência operando através das
faculdades cognitivas. Essa "senciência", como um aspecto da própria
Consciência, é uma manifestação direta da "mente total" (Brahman). E
é por isso que não conseguimos nos livrar do profundo sentimento de que
"eu" sou diferente da aparência manifesta. E assim de fato somos, mas
a ilusão (Maya) consiste no fato de que em vez de considerarmo-nos coletivamente
como a senciência que nos capacita reconhecer a manifestação (incluindo os
seres sencientes) que apareceu na Consciência, consideramos a nós mesmos como
entidades individuais separadas. E aí reside nosso sofrimento e prisão.
Tão logo haja a realização (o despertar
para o fato) que nós não somos entidades separadas, mas sim a própria
Consciência (com a senciência atuando como um meio para reconhecer a
manifestação), a ilusão de separação - a causa de nosso sofrimento e
aprisionamento - desaparece. Há então uma percepção clara de não
manifestos, somos Nômenos (oposto de fenômenos), e enquanto manifestos, somos
aparência - não mais separados do que substância e forma (o ouro e os
ornamentos de ouro). A manifestação surge do não manifesto e no devido tempo
submerge de volta no não manifesto. Os seres humanos como indivíduos são
realmente muito irrelevantes, exceto, é claro, como personagens ilusórios numa
peça num sonho que é conhecida como vida.
Ramesh Balsekar
Fonte: ricardo-yoga.blogspot.com
Continuação...
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